28.6.13

LLANSOL - SOKUROV - FAUSTO
Uma ligação surpreendente

Nos dois primeiros sábados de Julho, dias 6 e 13, a «Letra E» será o lugar de um encontro no mínimo surpreendente: o universo de M. G. Llansol e o assunto de Fausto, tal como nos surge no recente filme de Aleksandr Sokurov, que pôde ser visto durante algumas semanas num cinema de Lisboa.

Na sessão do dia 6, às 17 horas, faremos uma introdução à matéria história, mítica e literária de Fausto, com pontes para o universo Llansol e leitura de cenas do Fausto de Goethe, que inspirou Sokurov, pelos actores Diogo Dória, Manuel Wiborg e Elsa Bruxelas. E no dia 13 (às 16 horas, uma hora mais cedo do que o habitual!!) mostraremos o filme numa versão bluray de alta definição e conversaremos sobre as suas ligações a alguns filões da obra de Llansol.
Nesses dias, a pintora Ilda David' exporá na Letra E uma série de quadros feitos para a edição portuguesa da tradução do Fausto por João Barrento, mas não incluídos no livro.
E, como já vem sendo hábito, haverá mais um caderno que documenta esta relação, e que contém os excertos que serão lidos pelos actores no dia 6:

A seguir faremos a pausa de Verão, para retomarmos as actividades em Setembro ou Outubro. E anunciamos já as Quintas Jornadas Llansolianas de Sintra para os dias 12 e 13 de Outubro. Este ano trataremos o tema da «tradução» numa tripla vertente: Llansol tradutora (as traduções de poetas de língua francesa, e outras), Llansol traduzida (com a presença de alguns dos seus tradutores para castelhano, francês, alemão e inglês) e Llansol trans-criada, significando isto as passagens dos seus textos para várias artes – pintura, desenho, colagem, música, cinema, performance – com a presença de artistas que até hoje deram corpo a estas passagens criativas.

23.6.13

LLANSOL NA IMPRENSA PORTUGUESA


Tivémos ontem, sábado, mais um encontro na Letra E, desta vez para analisar e comentar a presença e a recepção crítica de M. G. Llansol e da sua Obra na imprensa portuguesa desde a publicação do seu primeiro livro, Os Pregos na Erva, em 1962.
Helena Vieira, editora e investigadora em Comunicação Social, fez uma síntese da evolução dessa fortuna crítica, salientou as vicissitudes e os momentos altos dessa presença nos jornais, com destaque para os anos sessenta e o primeiro livro de Llansol, muito comentado pela crítica da época; os anos entre 1984 e 1986, com o aparecimento quase simultâneo de Na Casa de Julho e Agosto e Causa Amante, e com a polémica desencadeada em torno de Um Falcão no Punho e do Grande Prémio de Romance da Associação Portuguesa de Escritores, que o júri, muito dividido, acabou por atribuir a um livro de António Lobo Antunes; finalmente, ainda em 1991, o ano com mais artigos, reportagens e críticas em que Llansol é tema (perto de setenta), uma vez mais em torno de um livro candidato ao Grande Prémio, que acabou porb receber nesse ano pela primeira vez: Um Beijo Dado Mais Tarde. A partir dos anos oitenta, de acordo com a análise de Helena Vieira, baseada nos cerca de seiscentos recortes de jornais que temos no nosso arquivo, Llansol passou a ser um caso incontornável na cena crítica portuguesa, e continuou a dividir as opiniões. Helena Vieira salientou as intenções dos críticos e os efeitos sobre os leitores de um certo tipo de adjectivação que se generalizou, e que acabou por criar na opinião pública uma imagem algo simplificada, e ambígua de Llansol e da sua Obra, muitas vezes etiquetada de «difícil», «estranha», «hermética», «inclassificável», «esotérica» (a própria Llansol o lembra quando, na carta a Eduardo Prado Coelho a propósito do Salon du Livre de Paris em 2000, escreve: «Serei sempre a esotérica de serviço»).

 (Foto: Vina Santos)

Paula Morão, professora da Faculdade de Letras de Lisboa e uma das vozes que a partir dos anos oitenta foi acompanhando criticamente –  no Expresso, no Jornal de Letras, no Letras & Letras, na revista Colóquio-Letras – os livros de Llansol que iam saindo, evocou algumas das razões (e das histórias de bastidores) para as polémicas em torno do seu nome por altura da atribuição dos prémios referidos, traçou paralelos com outros escritores portugueses e a sua imagem na crítica (entre outros, Rui Nunes, Irene Lisboa ou Maria Velho da Costa) e tentou situar um caso como o de Llansol no panorama crítico português e nas suas oscilações, desde João Gaspar Simões, figura controversa, mas um dos mais influentes e certeiros críticos regulares nos jornais portugueses. Também neste caso a própria Llansol se refere por vezes a Gaspar Simões nos seus cadernos, como foi lembrado por João Barrento, que leu uma passagem de um desses cadernos em que a ambivalência em relação a este crítico é evidente. Escreve M. G. Llansol em 28 de Março de 1979:
«O que torna Gaspar Simões intragável é o retorno constante à preocupação de que não pode enganar-se. Quanto ao que diz, diz melhor do que a maioria dos críticos portugueses que, com perseverança, não dizem nada (...) É estranho; enviei o meu último livro, O Livro das Comunidades, a João Gaspar Simões, e espero continuar a enviar-lhe outros livros; talvez a sua opinião me interesse mais do que eu julgo, talvez eu o demova e salve da sua infalibilidade (...) Apesar de tudo, ele reflecte com constância sobre a literatura.» (Caderno 1.06, pp. 261-262).

Em diálogo (fotos de Teresas Huertas)


Maria Gabriela Llansol comenta, aliás, com alguma frequência, sobretudo nos anos do exílio belga, o mundo literário, editorial e jornalístico português nos cadernos manuscritos, lamentando o sil|encio a que é votada, a situação da literatura portuguesa e o que vê já como uma certa mercantilização, a distância que medeia entre «as margens da língua» em que escreve e as «páginas literárias» que lhe chegam de Portugal, com o seu «pequeno comércio das relações e da cultura». Mais tarde, quando regressa a Portugal, a sua presença na crítica é uma constante sempre que sai um livro novo, e ela própria reconhece o papel decisivo de alguns dos seus críticos para iluminar os seus livros. Transcrevemos algumas dessas passagens, recolhidas por João Barrento nos cadernos do tempo de Jodoigne e Herbais, tempo de espera, entre 1979 e 1984:

17 de Março de 1979, sábado
Fechado é o exílio das cartas e das referências. Votaram-me ao silêncio mais completo. É como se eu estivesse numa prisão, ou obrigada a manter-me em residência vigiada, sempre com o silêncio do que escrevo à volta, sempre com o silêncio com que escrevo. Assim, tudo ignoro do que escrevo, a não ser a necessidade de o fazer.

30 de Maio de 1979, quarta
Destituo-me da literatura e passo para o lado da língua; abandonei o meu papel equívoco de mundanamente e mudamente pedir reconhecimento, e constatei que, para lá do campo da literatura vigente, há o campo inundado da língua, sempre a evoluir na fenomenologia do tempo; não peço mais ser o que não poderei ser, pois tomei deliberadamente outro caminho em que escrever faz parte dos amores íntimos, intimamente.

1 de Dezembro de 1981
... A crítica literária tinha uma linguagem paralela à da literatura, fechava-se no mesmo labirinto, que era simples. Diziam ambas que existia o que todos sabiam que existia, e diziam-no do ponto de vista de uma forma que a realidade não merecera (...)
Eu, quando lia o Jornal de Letras e Artes, não me sentia mais excluída do que antigamente. Mas agora havia um sinal que despontava: essa exclusão era positiva desde que eu acedera, com a alma inteira em resposta, ao que me tinha sido proposto. O que me tinha proposto ao longo da vida, tinha uma origem desconhecida, mas não vaga.  

28 de Dezembro de 1981
Chegou outro Jornal de Letras, Artes e Ideias, que leio com uma certa tristeza. Creio ter-me afastado muito das possibilidades reais da minha língua, hoje, onde estão as letras, as artes, as ideias, e as margens por onde tão velhos títulos deviam evaporar-se, tornar-se_______

21 de Julho de 1984
A crítica literária:
Ver um livro por tal grelha é como... olhar um diamante às escuras. A crítica literária, ou é cega, ou em tal escuro nenhum diamante pode ter brilho.
Feliz o livro que vive – e não teve crítica literária – e só foi lido. Respirou amplamente a sua leitura, e expandiu-a numa vasta paisagem, atingindo, por vezes, as fontes dos olhos de quem lê.

27 de Abril de 1984
Eduardo Lourenço considera as Trilogias obras de um escritor de futuro / universal – escritor solitário em terra portuguesa.
Principiava a sentir-me velha e densa. Velha da passividade que sinto através dos jornais, além do meu envelhecimento próprio. 
  
2 de Fevereiro de 1985, Mucifal
Crítica de A. Guerreiro a Na Casa de Julho e Agosto, sobre a qual medito profundamente. Vontade de recomeçar a escrever sem os desfalecimentos dos últimos tempos.
 
6 de Fevereiro de 1985
(num avulso do caderno 1.17, esboço de carta a Paula Morão)

Paula,
senti-me feliz por Na Casa de Julho e Agosto ter produzido efeitos de leitura e de análise, como a sua no Expresso. Pus-me a meditar através do que a Paula escrevera, e num instante pude atingir o livro, mais além, no seu belo texto.


Ao longo da sessão foi-se percebendo ainda como Maria Gabriela Llansol, na sua singularidade, foi funcionando ao longo dos anos como uma espécie de barómetro da crítica literária em Portugal. Na introdução ao caderno que, uma vez mais, distribuímos nesta sessão e que pode ser folheado em baixo, ou descarregado (com um conjunto de textos críticos representativos, entre 1962 e 2009, completando uma outra recolha, a do Caderno de Leituras editado pela Mariposa Azual em 2011), Helena Vieira conclui que «analisar a recepção jornalística desta Obra é também tentar desenhar o mapa desse campo, chamemos-lhe crítica literária, na última metade do século XX e princípios do século XXI». Nesse campo se desenham, quer «as grandes linhas de interpretação» (e também as de alguma recusa de interpretação), quer um «retrato da autora», ambas as coisas gerando, ou «o espanto desconcertado» (Gaspar Simões), ou «a admiração devota e confessa» (Eduardo Prado Coelho).

Leia alguns artigos aqui:


16.6.13

LETRA E:
LLANSOL NO ESPELHO DA CRÍTICA

A próxima sessão da «Letra E» do Espaço Llansol, no próximo sábado 22 de Junho, como sempre às 17 horas, fará um balanço da recepção crítica de Maria Gabriela Llansol na imprensa portuguesa no último meio século, desde a saída do seu primeiro livro, Os Pregos na Erva, em 1962. Helena Vieira, que vem estudando a recepção crítica da Obra de Llansol nos jornais portugueses, falará da «fortuna crítica» dessa obra na nossa imprensa, uma história em que intervêem, no último meio século, os nomes mais importantes da crítica jornalística portuguesa, desde Gaspar Simões, Alexandre Pinheiro Torres ou Álvaro Salema, passando por Maria Alzira Seixo, Fernando Pinto do Amaral ou Paula Morão, até António Guerreiro,  Eduardo Prado Coelho ou Manuel Gusmão.
À conversa com Helena Vieira estarão a professora e ensaísta Paula Morão e João Barrento. Como vem acontecendo desde o ano passado, haverá à disposição dos que vierem um caderno que recolhe alguns dos mais importantes textos sobre livros de Llansol desde Gaspar Simões.